terça-feira, 16 de abril de 2024

Conexões & Rupturas: pensando modelos de inovação

 


Os avanços tecnológicos se impõem num movimento que sempre os leva adiante de forma sempre crescente (cf. Hans Jonas. O princípio Responsabilidade).


Muitas vezes num ritmo cada vez mais acelerado.


Tudo isso alimenta uma produção de conhecimento impossível de ser assimilada, em proporções cada vez maiores. A partir de 1945, a humanidade alcança níveis drásticos de inovações. Zygmunt Balman, sociólogo polonês, alerta para a crescente dicotomia entre a avalanche de informações, de um lado, e a carência de conhecimentos sólidos e confiáveis. As consequências são preocupantes.


Isso nos leva também a um momento em que o conceito de inovação passa a ser banalizado, como por exemplo, nas declarações do CEO da Ocean Gate, destacadas após o caso da implosão do submersível Titan em 2023.


O que nos leva à pergunta: o que é mesmo inovação? O que significa quebrar regras? Qual a diferença entre invenção e inovação na perspectiva de ser "aceita amplamente"? 


Vemos como as invenções podem ser consideradas "meros objetos" criados pela criatividade humana. Ou descobertas cientificas podem ser desconectadas da rede de relações que lhes dá a devida importância em nossa sociedade. Neste sentido, embora a invenção possa ser fruto da acumulação de conhecimentos, as inovações, por sua vez, são ligadas também a forças sociais, a necessidades econômicas, a decisões políticas, a pressões públicas e a expectativas da sociedade que influenciam a direção da mudança tecnológica. São exemplos a máquina à vapor de Heron de Alexandria (séc. I d.C.) e o fungo de Alexander Fleming de 1935. Apenas depois de inúmeras conexões, em ambas os casos, surgem as inovações da máquina à vapor e a penicilina,


As inovações também não podem ser dissociadas da forma pela qual são produzidas. Por isso também não são meros objetos, mas objetos conectados a um processo de construção. O Ford modelo T, por exemplo, seria um sucesso se não tivesse sido produzido em uma moderna linha de produção, capaz de baratear seu preço? A GM teria sobrepujado a Ford se não tivesse reorganizado sua produção em departamentos dedicados a cada produto? Os carros da Toyota conseguiriam concorrer com os veículos americanos sem as inovações de logística e produção? Portanto inovar é promover conexões, 


Para sermos coerentes, tentaremos compreender a inovação sem recorrer a inúmeros conceitos, mas nos deteremos apenas a dois princípios já presentes no discurso do CEO da Ocean Gate: conexões e rupturas. Se tivermos sucesso, compreenderemos onde houve seu grande erro.

O primeiro conceito surge com a obra do sociólogo francês Gabriel Tarde, responsável por pensar uma sociologia baseada na interação entre indivíduos, onde cada um é sempre em relações a outros, ao que ele denominou "interpsicologia". Nesse sentido, hábitos de consumo, por exemplo, sempre recebem influência de um indivíduo sobre outro, numa rede interminável de conexões. Indivíduos imitam assim outros indivíduos, tal como vemos hoje através do conceito de influencer. Para Tarde, isso explica a difusão de inovações em sociedade. Mas além disso, as próprias inovações são imitações sobre imitações anteriores, sempre sendo adaptadas, otimizadas até se adequarem aos anseios do consumidor.  


As observações de Tarde acabaram se confirmando décadas depois. Hoje a interpsicologia do autor francês é estudada através do comportamento em redes sociais eletrônicas e possuem inúmeras aplicações, sendo criada uma abordagem rigorosa para a compreensão do funcionamento das redes.


Os conceitos atuais para o estudo de redes são capazes de descrever uma topologia a partir de seus nós, vínculos, diâmetros, densidade, clusterização etc., onde tudo parece conectado, mas segundo uma lógica mais compreensível em nossos dias.


Por outro lado, também temos uma ruptura radical em Schumpeter, onde a criação de novos mercados sequer é dependente das necessidades do cliente, ele pode ser educado para o consumo.


Ainda no âmbito das rupturas, vemos que a chamada inovação disruptiva, apesar do nome, não representaria uma ruptura tão radical quanto a de Schumpeter. Seu criador, Clayton Christensen  considera essencial nessa modalidade o atendimento a clientes de um mercado periférico, os quais não são atendidos ou são muito pouco atendidos. O exemplo perfeito seria a Southwest, companhia aérea que passou a oferecer voos bem mais em conta, customizando o atendimento. Invés de uma experiência requintada, cada passageiro poderia levar seu próprio lanche à bordo. Na contramão, a Aplle e o Uber não se enquadrariam nessa categoria, E a Kodak seria o caso de uma resistência à inovação.



Também cabe destacar que, apesar dos grandes avanços tecnológicos, a inovação continua dependendo sempre de pessoas. Quando elas são desconsideradas, as coisas simplesmente não funcionam, como demonstrou Elinor Ostrom, primeira mulher a ganhar um Nobel em economia.





Conforme vemos no gráfico de evolução do PIB da Noruega e da Finlândia, a economia norueguesa começa a decolar a partir da 1971, com a descoberta de seu primeiro poço de petróleo no mar do Norte.

Todavia, a Finlândia acompanha esse crescimento com a ajuda de uma outra descoberta: inovações educacionais. Essas inovações, acabam transformando a economia da Finlândia, baseada anteriormente na produção de celulose para exportação de papel, tornando esse país um polo de design e inovações tecnológicas.



Vemos aqui um resumo do modelo finlandês de educação, muito influenciado por educadores como Paulo Freire.


Vale destacar que, para fazer sua reforma educacional, a Finlândia precisou se opor radicalmente às tendências da época, que propunham uma rede educacional baseada na competição, enquanto o modelo finlandês passou a se basear em uma rede colaborativa. Isso nos coloca um ponto importante: a inovação não pode ser uma mera observação de tendências inovadoras. Essa observação tem sua importância, mas deve ser acompanhada de uma análise critica de quais agenciamentos essas tendências promovem, quais consequências estão em jogo, quais relações são fortalecidas ou enfraquecidas. Meramente acompanhar tendências sem uma avaliação crítica pode reduzir o profissional da inovação a alguém que apenas acompanha modas.

Portanto não há inovação sem pensamento crítico. Essa seria nossa resposta ao CEO da Ocean Gate. Seus conceitos não necessariamente estavam errados, mas os seus resultados foram desastrosos pela incapacidade de refletir sobre eles e fazer as escolhas certas. Nesse sentido, a análise crítica também é uma autocrítica. 

Além disso, na perspectiva do sucesso finlandês, com todo o conhecimento acumulado sobre redes sociais hoje, com todos os parâmetros para compreendermos a topologia de uma rede, é impensável não considerar uma analise mais cuidadosa sobre quais redes estamos ajudando a implementar ou não.


Por último apresento um exemplo de rede colaborativa utilizada pela Petrobras. No centro, apontando para o QR-Code podemos localizar o site da empresa onde encontramos os meios de se inscrever e participar dessa nossa rede de inovações.




Nenhum comentário:

Postar um comentário